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Movimentos sociais e juventude marcam abertura dos Seminários de Agroecologia e Educação do Campo do IFPE
Evento aconteceu no assentamento Normandia em Caruaru e segue de modo híbrido até dia 27
Poesia, debate, diversidade cultural, protagonismo da juventude camponesa e educação como direito. Esses foram os destaques da abertura do V Seminário de Agroecologia e o IV Seminário de Educação do Campo do IFPE, realizada na última segunda-feira (23) no Centro de Formação Paulo Freire, localizado no assentamento Normandia do Movimento Sem Terra (MST) em Caruaru. Com o tema Resistência e caminhos para a construção popular, o evento reuniu docentes, gestores, representantes de movimentos sociais, indígenas, quilombolas e estudantes dos campi Belo Jardim, Caruaru, Palmares, Pesqueira e Vitória de Santo Antão.
ABERTURA
A tarde começou com poemas de Patativa do Assaré recitados pelo cordelista e professor do IFPE-Belo Jardim Eugênio Pacelle, que arrancou aplausos da plateia. Na sequência, com um pandeiro, produtos da agricultura familiar e um lápis gigante, um grupo de lideranças juvenis e estudantes do IFPE protagonizou a mística de abertura do evento. Enquanto caminhavam pelo auditório em direção ao palco, ecoavam o seguinte canto: “Não vou sair do campo pra poder ir pra escola, educação no campo é direito, não esmola”. A toada era alternada por versos recitados por Paulo Henrique, dirigente do MST e anfitrião do encontro. “Sejam todas e todos bem-vindos a este espaço, que é um espaço de muita resistência e de muita luta, não só aqui no estado de Pernambuco. E sintam-se abraçados e abraçadas pela mística que rodeia o centro de Formação Paulo Freire. A gente se sente muito feliz de estar sediando a abertura do nosso seminário deste ano”, declarou.
Com dez participantes, a solenidade contou com a presença de representantes de diferentes movimentos sociais e da gestão do IFPE: Adelson Araújo da Federação dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras familiares do Estado de Pernambuco (FETAPE), Márcia do Angico, representante dos Povos Quilombolas de Pernambuco, Giovana Silva do Comitê Pernambucano de Educação do Campo, Vilmar Leandro do povo Xukuru do Ororubá, Giovani Leão da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Elaine Rocha, diretora-geral do IFPE-Caruaru, Assis Leão, Pró-Reitor de Ensino do IFPE, Ana Patrícia Falcão, Pró-Reitora de Extensão do IFPE, Camila Lima, presidenta da comissão organizadora do evento e José Carlos de Sá, Reitor do IFPE.
Além da emoção de voltar a se encontrar de forma presencial após dois anos de pandemia, as falas destacaram o protagonismo juvenil, a importância de uma construção coletiva por políticas públicas que garantam o acesso à educação e a uma alimentação saudável e a valorização da luta e resistência dos povos da terra.
“Que escola do campo queremos? Um caminho é essa construção com os povos do campo, com a população do campo, nada construído sem que os atores principais estejam presentes. E eu fico muito orgulhoso, muito feliz nesse momento de volta à presencialidade que tanto esperávamos, que a gente tenha conseguido, mais uma vez, reunir muitos atores, muitos movimentos. A gente agradece muito que os movimentos sociais aqui presentes acreditem nessa proposta do Instituto Federal de Pernambuco de promover uma discussão democrática, rica, onde todos possam colaborar. Afinal, na nossa perspectiva, o conhecimento não está somente dentro da academia. Nós temos muito a aprender com todos esses que chegam para colaborar conosco. Os camponeses, os povos do campo de modo geral, inclui pescadores, marisqueiros, enfim, todos aqueles que, de uma forma ou de outra, utilizam-se de seu conhecimento e exploram a natureza de uma forma sustentável, cuidadosa e respeitosa”, defendeu o Reitor do IFPE, José Carlos de Sá.
JUVENTUDE CAMPONESA
Na segunda mesa do dia, o tema foi “Juventude Camponesa e Agroecologia: protagonismo da juventude nas relações sociais do campo”. Mediada pela estudante egressa do curso de Química do IFPE-Recife e ex-integrante da União dos Estudantes Secundaristas de Pernambuco (UESPE), Roberta Lima, o debate contou com a participação de três lideranças juvenis: Eduarda Vasconcelos, da Pastoral da Juventude Rural – PJR, do Coletivo de Juventude da Via Campesina – Brasil, de Mateus Manassés, membro da juventude Camponesa do polo da Borborema e dirigente do Sindicato dos trabalhadores e trabalhadoras agricultores e agricultoras rurais de Queimadas-PB, e Rafaela Lima, quilombola do Quilombo Barro Branco e estudante egressa do IFPE-Belo Jardim.
As três falas chamaram atenção para a importância da educação do campo na permanência de jovens em seus territórios e na construção de suas identidades. Após explicar um pouco sobre a organização da Via Campesina, Eduarda destacou a família, a escola e a igreja como espaços fundamentais nas relações sociais do campo para a juventude. “Na roça, todo mundo é família. Esses laços são bem mais fortes. E a escola ela é bem simbólica nisso, porque ela traz a identidade da comunidade. Aí, quando a gente tira a escola do campo e leva pra cidade, a gente já perdeu um pouco da identidade da comunidade. Nosso contexto é o da enxada, do milho. A educação do campo ela vem pra isso. E a igreja tem um papel fundamental nessa coisa de valorizar o ser humano e de valorizar a comunidade”, avaliou.
Já Manassés trouxe os desafios das juventudes no território da Borborema, na Paraíba, como a migração, a desvalorização da agricultura, a exploração do trabalho, o envolvimento com drogas, a falta de autonomia, de recursos e políticas públicas. Nesse sentido, ele também denunciou o impacto do modelo de energia eólica na agricultura familiar e ressaltou a importância do sindicalismo de base rural e da comunicação como estratégias de luta. No final de sua fala, Manassés pediu para que a plateia repetisse o lema “Juventude e Agroecologia, a luta é todo dia!” e com a bandeira de seu coletivo erguida, cantou: “Somos jovens camponeses. Sair do campo, não, senhor. Vivemos da agricultura, mão calejada, sim, senhor. E com muito orgulho”.
Na sequência, Rafaela Lima, agrônoma recém formada pelo IFPE-Belo Jardim, entoou o canto ancestral para Oxum “Oro Mi Maió”. Ela compartilhou um pouco de sua realidade enquanto estudante cotista, agricultora e quilombola da comunidade Barro Branco em Belo Jardim e o papel do IFPE, em especial do Núcleo de Estudos Afro-Indígenas (NEABI), em seu processo de reconhecimento como jovem mulher negra. “Lá, a gente tá numa resistência muito grande de reconhecimento da comunidade, porque ela foi reconhecida há pouco tempo. E o que é ser quilombola no IFPE? Comecei a me reconhecer no campus também, aprendi bastante coisa e participei também do grupo Jovem Camponês. Eu me realizei ali naquele momento. E estou muito feliz de estar aqui”, declarou.
CINE RESISTÊNCIA
O primeiro dia de programação foi encerrado com o Cine Resistência, que trouxe uma mesa totalmente dedicada à experiência da Ororubá Filmes, coletivo audiovisual da juventude indígena Xukuru do Ororubá. Mediada por Vilmar Leandro, Xukuru e estudante da Licenciatura em Física do IFPE-Pesqueira, a sessão exibiu o documentário Limolaygo Toype – Agricultura que Cuida, que retrata as práticas e ações agroecológicas e de promoção da saúde, práticas tradicionais de saúde, de alimentação, cuidado, espiritualidade e preservação ambiental no povo Xukuru do Ororubá em Pesqueira.
Após a exibição, o público presente no auditório do assentamento Normandia e participantes que acompanhavam a transmissão ao vivo através do canal de youtube do IFPE puderam debater com o grupo de realizadores composto por Kleber Xukuru, Guila Xukuru, Micaele Xukuru e Diego Xukuru. Além de compartilharem um pouco de suas trajetórias, também foi contextualizada a origem da Ororubá Filmes em 2008 e como o audiovisual é visto pelo povo Xukuru enquanto mecanismo de mobilização da juventude e de disputa de narrativa.
“Hoje, o povo Xukuru tem autonomia de contar sua própria história”, destacou Kleber. “O povo Xukuru começa a construir a narrativa a partir da sua ótica, a partir de onde entende que tem lugar de fala e colocando a partir dessa realidade o que entende que quer dizer também”, complementou Guila. “Tudo o que a gente produz é a partir da nossa realidade, a partir da nossa vivência. E a gente tem contribuído também nesse processo de formação do guerreiro e da guerreira Xukuru nesse intuito. A gente produz e a gente também disponibiliza nas escolas, nesses espaços de formação”, explicou Micaele. Por fim, Diego concluiu: “O audiovisual, hoje, a gente trabalha muito nessa perspectiva de fortalecer nossa tradição, fortalecer nossa cultura, nossa organização. E também como um modo de defesa do povo, além de estar trazendo a juventude pra luta e mostrando mais uma arma que eles podem estar adotando na sua vida”.
O V Seminário de Agroecologia do IFPE e IV Seminário de Educação do Campo do IFPE seguem até sexta-feira (27) de forma híbrida (presencial e virtual). Confira a programação completa aqui.